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Ghosting, haunting e benching: as práticas das novas relações

“Numa época em que a sociedade está repleta de meios de comunicação que permitem, cada vez mais rápido, estar em contacto com outros, nunca foi tão fácil conhecer e esquecer pessoas. Abre-se o Facebook, o Instagram ou até o Tinder e basta enviar uma mensagem, pedir para seguir ou “gostar” para que se possa estar em contacto com alguém. Ao mesmo tempo que isso acontece, as relações profundas tornam-se caminhos mais difíceis de encontrar. As redes sociais, as aplicações de encontros e, mais importante, a maneira como são usadas, têm cada vez mais impacto nas relações que vivemos: o ghosting, o haunting e o benching são só algumas das novas práticas que ganharam nome nos últimos anos, graças à sua visibilidade, e à maneira como as pessoas vivem as suas relações nesta nova era.”

Tive muito gosto em conversar com a jornalista Adriana Claro da “MAGG” sobre as práticas das novas relações.

continuar a ler: https://magg.pt/2018/04/03/ghosting-haunting-e-benching-as-praticas-das-novas-relacoes/

 

ghosting

Ghosting – O Novo Mundo das Relações

O vocábulo ghosting foi eleito pelo dicionário britânico Collins como uma das palavras do ano de 2015. Derivada do inglês ghost (fantasma), o termo tem sido usado para designar uma forma de terminar relacionamentos (inclusive, quando, aparentemente, tudo está bem) na era digital em que a pessoa desaparece, tal qual um fantasma, e deixa de responder às mensagens dos aplicativos e redes sociais, eximindo-se de dar qualquer explicação.

O ghosting está intimamente ligado à forma superficial como a maioria das relações on-line é construída. Não é, portanto, de estranhar que a maneira como certos relacionamentos terminam esteja em linha com a forma como começam.

O facto de tudo se passar muito rapidamente, impede o aprofundamento. Sem tempo para as pessoas se conhecerem melhor (essência das relações), os relacionamentos não se consolidam.

Numa altura que o vídeo e a fotografia estão tão presentes no nosso dia-a-dia é natural que a imagem tenha um peso muito grande. O “match” que por vezes está na base de alguns relacionamentos deu-se através de uma “imagem” que editei de mim próprio e que atraiu o outro. Se eu mostrar a minha “imagem” não editada a atracção acaba? Posso mostrar quem realmente sou? Receando as respostas, o aprofundamento fica comprometido, e sem isso é espectável que as relações durem pouco. Começar / Terminar acaba por ser apenas mais um aspecto dentro deste modelo de relacionamentos.

 

A Conexão é muito mais frágil que o Vínculo

Actualmente estamos todos conectados uns com os outros mas o número de vínculos é cada vez menor. O vínculo é um tipo de ligação mais profunda. A conexão pode ser vista como estar em “contacto com”, e a vinculação como uma união. A união-relação pressupõe a criação de uma quantidade de vias que me ligam ao outro e nas quais circulam os afectos.

Nós precisamos das relações para nos conhecermos e para nos alimentarmos afectivamente. Os relacionamentos são uma espécie de espelho que nos devolve a imagem do que somos mas, tendo em conta que são também um alimento, do que poderemos vir a ser. Se não se aprofundam as relações, perpetua-se a fragilidade – nas pessoas e nos relacionamentos.

Os outros são um espelho onde nos vemos, mas essencialmente, onde nos conhecemos e reconhecemos. Se o espelho que me valida não tem uma presença continuada (porque se afasta ou eu me afasto dele) não consigo avançar, porque a cada 10 segundos paro para perguntar: “Espelho meu, espelho meu, há alguém mais bonito que eu?”.

 

“Saiu para comprar cigarros e nunca mais voltou.”

O desaparecer sem deixar rasto não é novo. O mítico episódio “foi comprar cigarros e não voltou” perdeu o glamour cinematográfico e caminha para uma banalidade assustadora. Actualmente 50% dos homens e das mulheres referem terem sido alvo de ghosting, e um número aproximado praticou.

 

O que leva a fazer Ghosting?

Entre as principais razões podemos encontrar:

– Imaturidade emocional: “Eu não compreendia exactamente o que sentia, então, em vez de tentar falar, eu ghosting (desapareci).”

– Evitar o confronto.

– Nos casos em que se desenvolveu uma empatia é mais difícil terminar.

Quanto mais isto acontece, mais as pessoas ficam insensíveis a isso, e a probabilidade de que o reproduzam aumenta.

 

Como se sente alguém que foi ghosted?

– A impossibilidade de encerrar pode ser considerada “enlouquecedora” (no sentido de não poder ser pensada; de não ter uma lógica).

– Pode ser uma experiência traumática (que leve a fugir de novas relações)

– Aquele que é deixado sofre ainda mais devido à indiferença. Pior do que ser deixado é perceber que o companheiro nem sequer achou que valesse a pena “terminar”.

– Paralisado e impotente. O ghosting não dá nenhuma pista para reagir. A pessoa fica sem conseguir lidar com a situação porque não sabe o que verdadeiramente se passou.

– O ghosting é uma forma de crueldade emocional porque a possibilidade de reagir é restringida. Não me sendo dada a possibilidade de fazer perguntas, de arranjar elementos que me ajudem a construir uma narrativa para o sucedido, eu posso ficar enredado numa quantidade de “porquês” (que podem conduzir a uma culpabilização). Perante esta situação eu fico impedido de processar emocionalmente a experiência de rejeição e de perda.

– A ausência do outro impede-me de expressar, de exteriorizar em direcção a ele o que estou a sentir. Impede-me de gritar, de partir pratos, de protestar, enfim, ser ouvido (a existir; sou ouvido logo existo). Este processo de nos “defendermos do ataque” desferido por aquele que nos rejeita é fundamental para a preservação da auto-estima. Numa situação de ghosting é provável que em vez de pôr em causa a relação eu próprio me coloque em causa.

 

A vida continua

Embora trabalhos recentes mostrem que uma percentagem dos sujeitos acha o ghosting aceitável em algumas circunstâncias (relações curtas), a maioria considera que se trata de uma atitude inaceitável.

Para algumas pessoas o ghosting pode ser uma experiência devastadora. Apesar disso, as pessoas mais maduras e equilibradas emocionalmente conseguem com maior rapidez encontrar uma saída para esta situação. A capacidade de rever os acontecimentos, de compreender e aceitar o papel que desempenhámos no relacionamento, permite, não só sair da situação mais rapidamente como desenvolver um faro para reconhecer situações semelhantes.

 

O Ghosting é muito frequente?

Nos trabalhos de Freedman et al. recentemente publicados no Journal of Social and Personal Relationships, 25% dos participantes referem que foram alvo de ghosting, e 20% indicaram que o praticaram aos companheiros.

Sem surpresa, a maioria dos sujeitos referiram que o ghosting é uma forma inaceitável de terminar uma relação. No entanto, quanto mais curta a relação mais aceitável.

 

Quem está mais susceptível ao Ghosting?

Entre os vários factores que podem influenciar o ghosting, Freedman et al. analisaram as crenças acerca dos relacionamentos.

As pessoas que acreditam no destino – “Se um relacionamento está destinado a resultar, ele irá resultar, e se não estiver, ele falhará”-, são mais propensas a olhar para o ghosting como aceitável.

Por outro, as pessoas que acreditam no crescimento das relações, que consideram que os bons relacionamentos exigem trabalho, e que o sucesso de um relacionamento depende do esforço do casal, consideram o ghosting inaceitável.

É provável que aqueles que têm uma vinculação insegura e personalidades narcísicas  possam recorrer mais ao ghosting como forma de terminar um relacionamento.

 

Culpados e inocentes

Não temos números que nos digam que o ghosting acontece mais agora, mas é razoável assumir que na era digital, e tendo em conta novos contextos de relacionamentos (on-line dating), a probabilidade de algumas pessoas, simplesmente desaparecerem, seja maior.

Não entrando em comparações entre aquele que pratica e aquele que foi sujeito ao ghosting, ambos podem ser vistos como vítimas desta nova era onde reina o individualismo e as pessoas são vistas como objectos descartáveis.

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A Síndrome de Tinderela

Ter vários pretendentes com quem se conversa nas redes sociais e não concretizar nada com nenhum, não é azar mas parte do Síndrome de Tinderela (o nome desta síndrome tem origem na aplicação Tinder).

Através do Tinder muitas pessoas conseguiram ter mais encontros amorosos num mês do que ao longo de toda a vida. A parte negativa desta forma simples, acessível e imediata de fazer “match” com alguém é precisamente a facilidade com que ambas as partes encontram o “par perfeito” através de um perfil de características adornadas e fotografias retocadas.

Flertar com um ou vários homens ao mesmo tempo através das redes sociais não garante o início de um relacionamento bem-sucedido. Pelo contrário, o uso constante destas ferramentas digitais está associado ao medo que uma mulher tem de se dar a conhecer e conhecer uma pessoa de maneira real, de experimentar sentimentos mais profundos e de se comprometer.

A síndrome Tinderela levanta um paradoxo interessante, mas muito preocupante. As aplicações e – em geral – a tecnologia sugerem facilitar a nossa vida, no entanto, ao invés de as apps como o Tinder servirem como plataforma facilitadora para ampliar o círculo social e começar a conhecer pessoas reais, estas estão a tornar-se causa de maior afastamento e solidão.

Não estou certo que exista a síndrome Tinderela, como não estou certo que todas as pessoas que utilizam este género de aplicações se enquadrem no quadro descrito. Para muitas pode ser uma alavanca importante para dar início a uma relação que se pode ir aprofundando. Uma ferramenta importante para enfrentar a timidez. Mas para grande parte das pessoas não passa de um jogo de bate-e-foge, onde quase todos perdem, mesmo quando vencem.

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