Boas razões para ficar num relacionamento mau
Tendo consciência de que o nosso relacionamento é insatisfatório, por que ficamos? A pesquisa em psicologia pode ajudar a explicar a nossa tendência para iniciar e manter relacionamentos com parceiros que não respondem às nossas necessidades.
Porque mantemos relacionamentos maus
1. Podemos estar satisfeitos com relacionamentos insatisfatórios
Em pesquisas recentes que exploram as decisões das mulheres sobre permanecer ou sair dos seus relacionamentos, o factor mais importante nas decisões das mulheres para permanecer na relação foi a satisfação no relacionamento (Edwards et al., 2011). Como podemos estar satisfeitos com relacionamentos insatisfatórios? Alguns indivíduos, especialmente aqueles que têm baixa auto-estima ou aqueles que se consideram menos atraentes, têm baixos “níveis de comparação” (Thibaut e Kelley, 1986; Luciano e Orth, 2017; Montoya, 2008). O nível de comparação pode ser entendido como um “padrão”: aquilo que se espera receber num relacionamento. Indivíduos com baixos níveis de comparação não esperam muitos benefícios dos seus relacionamentos, mas esperam muitas dificuldades. Se você tem um baixo nível de comparação, pode manter-se num relacionamento ruim porque está de acordo com as suas baixas expectativas. Os indivíduos com baixa auto-estima são mais propensos a envolverem-se em relacionamentos de menor duração e sofrem novas diminuições de auto-estima quando os seus relacionamentos terminam (Luciano e Orth, 2017). Da mesma forma, as mulheres que sofreram abusos em criança relatam mais satisfação nos relacionamentos de menor qualidade (Edwards et al., 2011).
2. Mudança nas Prioridades
Os mecanismos comuns que ajudam a manter os nossos relacionamentos são o “aprimoramento dos parceiros” e as “ilusões positivas”. Ambos os termos referem-se ao facto de que tendemos a ver os nossos companheiros de forma positiva, às vezes irrealisticamente (Morry et al., 2010; Conley et al., 2009). Nos casais gays e lésbicas, bem como nos casais heterossexuais, aqueles que vêem os seus parceiros mais positivamente também relatam mais satisfação no relacionamento (Conley et al., 2009). Como podemos ver nossos parceiros de forma positiva quando estamos em relacionamentos indesejáveis? A pesquisa mostra que valorizamos as características positivas que os nossos parceiros apresentam mais do que outras características (Fletcher et al., 2000). Por exemplo, se o seu parceiro é generoso, mas não introspectivo, você pode vir a valorizar mais a generosidade do que a introspecção ao longo do seu relacionamento. Quando os nossos parceiros revelam características negativas, podemos reduzir a importância dessas características e aumentar a importância dos traços positivos que possuem (Fletcher et al., 2000).
3. Alternativas de baixa qualidade
Se você está numa relação indesejável, pode considerar alternativas a essa relação, incluindo estar sozinho ou começar um relacionamento diferente (Thibaut e Kelley, 1986). Se perceber que uma alternativa pode ser preferível à sua situação actual, é mais provável que abandone o seu relacionamento, mas se entender que as alternativas são de menor qualidade, é mais provável que permaneça, apesar de tudo, num relacionamento insatisfatório. Pesquisas recentes mostram que afigurar alternativas ruins para o relacionamento aumenta a probabilidade de ficar com um parceiro indesejável, e que as mulheres com baixa auto-estima percebem menos alternativas desejáveis aos seus relacionamentos actuais (Edwards et al., 2011). Além disso, o divórcio é mais comum nos países onde as mulheres conseguem mais independência económica e em que a proporção de homens para mulheres é maior, sugerindo que as mulheres são mais propensas a divorciar-se se tiverem os meios económicos para viver de forma independente, bem como se existir uma abundância de outros possíveis parceiros (Barber, 2003).
4. Manipulação
Se o seu parceiro está ciente de que você deseja terminar o relacionamento, ele ou ela podem usar diferentes métodos de manipulação para forçá-lo a permanecer. A manipulação emocional, como o rebaixar, desprezar ou mesmo ameaças de violência contra futuros parceiros, podem ser usadas para conservar o relacionamento (Buss e Shackelford, 1997; Primos e Fugère, no prelo). Os homens com baixa auto-estima, bem como aqueles que se sentem menos atraentes que os seus parceiros, podem ser mais propensos a usar manipulações para evitar que seus parceiros terminem a relação (Buss e Shackelford, 1997; Holden et al., 2014). A angústia associada ao abuso emocional ou às implicações físicas da violência do parceiro são fortes impedimentos para aqueles que procuram terminar um relacionamento. Edwards et al. (2011) sugerem que as mulheres que estão psicologicamente angustiadas podem não sentir que têm a capacidade de deixar os seus parceiros.
5. Investimento
Outros obstáculos importantes para pôr fim a um relacionamento mau incluem os investimentos compartilhados com os companheiros (Adams, 1965). Como Copp et al. (2015) referem, investir muito tempo num relacionamento ou compartilhar investimentos, como uma casa ou filhos, torna os casais mais propensos a ficarem juntos. De acordo com Rego et al. (2016), quando já investimos muito tempo, esforço ou recursos num relacionamento, muitos de nós continuamos esse investimento mesmo quando pode não ser o melhor para nós; Temos tendência para continuar relacionamentos infelizes quando investimos neles. Os autores também explicam que, ao tomar decisões no que diz respeito ao relacionamento, muitas vezes dependemos mais de emoções do que de deliberações racionais. O que nos leva ao última razão, porque muitas vezes ficamos em relacionamentos ruins …
6. Amor
Os psicólogos distinguem entre três diferentes componentes: a componente cognitiva ou pensamentos, a componente afectiva ou sentimentos, e a componente comportamental ou acções (Kassin et al., 2011). Frequentemente, essas componentes não estão alinhadas umas com as outras. Por exemplo, no caso de um relacionamento ruim, os seus pensamentos podem ser negativos, dizendo que seu parceiro não é bom para você, mas os seus sentimentos ainda podem ser positivos. Podemos continuar a amar os nossos parceiros, embora reconheçamos conscientemente que estamos envolvidos em relacionamentos ruins. Também é possível que fortes sentimentos positivos e negativos em relação a um parceiro possam coexistir (Zayas e Shoda, 2015).
Traduzido/adaptado por Pedro Martins
a partir de “The Good Reasons We Stay in Bad Relationships” – Madeleine A. Fugère
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