Falar alto e bom som
Por vezes pode parecer terrivelmente claro que, simplesmente, ninguém liga, ninguém se importa. Mal dão conta da nossa presença, dificilmente se aproximam para ouvir o que temos a dizer, não apanham nenhuma das nossas deixas – e, estão extremamente absorvidos com os seus próprios projetos e preocupações do dia-a-dia.
Com base em tais evidências, é fácil para nós cairmos numa conclusão perigosamente condenadora e muito dolorosa sobre nossa situação: estamos profundamente sozinhos – muito longe de qualquer possibilidade de conexão ou compreensão.
Mas a verdade pode ser ao mesmo tempo bastante mais simples e mais esperançosa.
De uma maneira geral estamos bastante disponíveis para ajudar quando percebemos que é urgente fazê-lo, mas também estamos distraídos e ocupados com nossas vidas para conseguirmos aperceber-nos que se passa algo com as pessoas que nos são próximas, a menos que o problema seja apresentado de forma menos intrincada e mais clara.
Então, mas só então, entramos em acção e fazemos uso de todas as nossas capacidades e determinação de lidar com o sofrimento das outras pessoas. Por outras palavras, respondemos bem aos berros, mas terrivelmente com o subentendido.
A questão toma outra proporção nos casos trágicos em que alguém que conhecemos põe termo à sua própria vida. Estamos certos de que se tivéssemos sabido que se sentiam tão desesperados, teríamos feito qualquer coisa para ajudar. Ao mesmo tempo, também sabemos que não fazemos muitas perguntas, não olhamos muito de perto para certos sinais, e certamente, damos a impressão de estarmos constantemente ocupados. Acabamos a sentir-nos, obviamente, destroçados.
Ganharíamos muito se tivéssemos em conta certos factos sobre a natureza humana sem rancor ou surpresa quando estamos mais frágeis e desesperados. A aparente indiferença dos outros é verdadeiramente aparente. Precisamos aprender a falar de modo que se oiça – até que se oiça.
Infelizmente, tendemos a não ter confiança para fazê-lo precisamente quando é mais necessário, devido a um constrangimento primitivo que se apodera de nós quanto estamos frágeis, como se cada ser humano tivesse que passar pela vida contando apenas consigo. Parte da tragédia de estar desesperado é sentirmos que o nosso sofrimento é ilegítimo.
No entanto, nunca devemos esquecer-nos que, seja qual for a indiferença que possamos sentir, estamos rodeados de pessoas que quando vêem alguém em perigo, se atiram ao mar para o salvar. Se sabemos de forma clara que alguém (mesmo apenas um conhecido) está a precisar muito de nós, provavelmente deixamos tudo e corremos para ajudar.
Mas, ao mesmo tempo, somos incapazes de ler mentes e interpretar indirectas. Da próxima vez que estivermos em dificuldades, devemos lembrar-nos de que não devemos sentir-nos diminuídos por pedir ajuda, sabendo que a maioria das pessoas que nos rodeiam responderá à nossa dor uma vez que a ouçam. Precisamos lembrar-nos de falar alto e bom som.
Traduzido/adaptado por Pedro Martins
a partir de Alain de Botton
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