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Psicoterapia

automutilação -psocura de atenção ou de vinculação

Automutilação: O Que É e Como Ajudar

A automutilação num amigo, num parceiro, num filho ou em alguém com quem você trabalha pode gerar uma profunda ansiedade e suscitar uma série de sentimentos perturbadores – confusão, raiva, desamparo, preocupação e até pânico.

Esses sentimentos podem levar aqueles que estão a tentar apoiar a pessoa que se mutila a entrar num modo socorrista (eu tenho que fazer tudo o que eu puder para que ele pare) ou, em vez disso, uma espécie de menosprezo bem-intencionado (eles estão à procura de atenção, se eu ignorar, isso desaparece).

 

“É como se toda a dor que se vem acumulando há dias, simplesmente, se desvanecesse num único momento”

 

Porque é que ele se magoa? Porque é que não pode, simplesmente, falar comigo? Como posso pará-lo? Essas são as questões que circulam em torno do problema da automutilação. Então, naturalmente, no meio de toda esta preocupação e pânico – há a questão de como é ser a pessoa que se está a ferir?

Porque se automutilar?

A automutilação não é um distúrbio mental. A automutilação é um problema na regulação emocional. A regulação emocional significa a capacidade de uma pessoa (a) perceber que está a viver uma experiência emocional; (b) que a nomeie e compreenda; (c) a expresse aos outros de uma forma sadia e, finalmente (d) gerir o sentimento de modo a torná-lo mais tolerável. Algumas crianças, adolescentes e adultos voltam-se para a automutilação porque o seu sistema de regulação emocional não é suficiente para diminuir a dimensão – insuportável – da sua dor.

Podemos ver isso na forma como as pessoas que se mutilam descrevem o que sentem. Essa percepção é valiosa para aqueles que tentam entender a automutilação. Eis o que nos foi dito por pessoas que acompanhamos em psicoterapia:

“É como se toda a dor que se vem acumulando há dias, simplesmente, se desvanecesse num único momento”

“Quando eu me corto, é o único momento que me sinto real, viva, como estou aqui agora”

“É como se a automutilação fosse o meu único amigo que me faz sentir melhor.”

“Eu não quero que as pessoas saibam, não se trata de dizer “olhe para mim”, é sobre encontrar uma maneira de me sentir calma sem magoar ninguém”

“É a única coisa que posso controlar na minha vida, por isso diminui a minha ansiedade.”

“Se eu não me cortasse, estaria morta. Cortar, literalmente, mantém-me viva”

 

Indivíduos que lutam para tolerar a dor e o stress e pessoas com problemas psicológicos, frequentemente, encontram-se num estado de hiper-excitação (excepcionalmente alerta, nervosos, ansiosos) ou num estado de hipo-excitação (sentindo-se mortos e entorpecidos interiormente). A automutilação é uma maneira poderosa de encontrar o meio-termo entre os dois estados emocionais extremos. Quando estão ansiosos, a automutilação acalma; e quando se sentem mortos por dentro, a automutilação desperta o corpo e a mente. A automutilação torna-se a figura de vinculação da pessoa, a sua base segura.

Procura de atenção ou procura de vinculação?

Como pais, amigos, professores, cônjuges – nós tentamos fazer o melhor possível para entendermos quem se mutila. Podemos, naturalmente, vê-lo como uma maneira de chamar à atenção; e assim podemos ignorá-lo, minimizá-lo ou criticá-lo, ou pior – gozar.

Há uma outra maneira, mais compassiva, mas também mais eficaz, de ver e compreender a automutilação: é vê-la como uma busca de vinculação.

Um marco fundamental para uma criança pequena é aprender a regular as suas emoções, e elas fazem isso com a ajuda das suas figuras de vinculação (pais, cuidadores, outras pessoas importantes), que de alguma forma entremeiam essa regulação.

 

“Aqueles que não desenvolveram a capacidade de regulação emocional em pequenos vão encontrar outras maneiras de trazer as suas figuras de vinculação para perto.”

 

A teoria da vinculação mostra-nos que aqueles que não desenvolvem a capacidade de regulação emocional quando são pequenos (devido ao stress familiar, estilo parental, temperamento, problemas de saúde e assim por diante) encontram outras maneiras (inseguras) de trazer as suas figuras de vinculação para perto. De alguma forma, isso traz-lhes conforto e segurança. Alguns indivíduos escondem as suas emoções e, portanto, mantêm os outros por perto porque não são um “problema”; outros podem fazer um grande alarido das suas necessidades, e isso mantém os outros por perto, com o intuito de responder à crise.

Então, o que é que isso tem a ver com a automutilação? A automutilação é um comportamento de busca de vinculação. Aqueles que se mutilam em segredo (sem que ninguém saiba) regulam as emoções e mantêm os outros afastados. Assim, lidam com dor sozinhos, pois para eles parece mais seguro. Os que não escondem a automutilação sentem-se mais seguros quando os outros os atendem, seja por meio de compreensão ou por meio de críticas. Qualquer atenção é melhor que nenhuma atenção.

Embora a ‘atenção’ possa ser uma consequência da autoagressão, o propósito dela é regular a emoção e / ou aproximar os outros, a fim de atender a uma necessidade emocional não satisfeita.

Então, o que fazer?

A experiência de trabalhar com pessoas que se mutilam mostrou-nos que minimizar, ignorar ou criticar a pessoa não funciona. Na verdade, isso piora! As reações bem-intencionadas de outras pessoas aumentam o sentimento de vergonha e autoaversão na pessoa que se mutila, o que aumenta a necessidade de se mutilar.

Em vez disso – procure ligar-se emocionalmente e reflicta sobre o que sente. Faça o que precisa fazer para se sentir emocionalmente conectado – mostre que se importa; mostre que está lá. Então, e só então, você pode ajudá-los a lidar com o problema.

Aqui estão as nossas principais dicas:

  1. Fale sobre isso. Deixe-os saber que você notou; que está curioso. Que você questiona que sentimento leva uma pessoa a magoar-se. Não deixe que a automutilação seja um elefante no meio da sala.
  2. Mantenha-se calmo e com os pés assentes na terra. A sua ansiedade criará mais ansiedade neles. Eles precisam que você seja firme, cuidadoso e que não faça julgamentos.
  3. Tente imaginar que necessidade emocional está por trás da automutilação, caso eles não o consigam colocar em palavras. Ofereça-lhes a sua “linguagem afectiva”, seja isso um abraço, aceitação, palavras gentis, actos de reflexão ou respeito.
  4. Mostre que você “os mantém em mente” mesmo quando não estão juntos.
  5. Ajude-os a elaborar os seus “gatilhos”. O que lhes dá a vontade de se mutilar? Pensar em conjunto que tipo de coisa faz disparar a vontade de se mutilar pode levar à sua redução.
  6. Escolha com cuidado a quem você conta. Outras pessoas saberem pode causar vergonha, mas também pode ser um alívio. Decidam juntos.
  7. Fique de olho na segurança. A automutilação não leva ao suicídio, mas as pessoas com tendências suicidas são mais propensas a se automutilar. Incentive-os a cuidar das suas feridas.
  8. Considerem o tratamento psicoterapêutico. Situações destas raramente se resolvem sem apoio especializado.

 

Traduzido/adaptado por Pedro Martins

a partir de “Self-harm: Attention seeking or attachment seeking? –  Shoshanah Lyons

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