Como sabemos o cérebro é um órgão construído por e, para a relação e comunicação; e agora sabemos que os neurónios espelho são a parte do cérebro especificamente destinada a essa missão.
As primeiras experiências em símios mostraram que os neurónios espelho não se excitavam unicamente quando o símio realizava uma acção dirigida a um fim, mas também quando observava que outro símio (ou humano) a executava. Daí que se tenha definido esta nova função desta classe de neurónios com a expressão “o símio observa o símio faz” e que agora tem a definição de neurónios em espelho.
A importância desta descoberta para a compreensão da mente humana é tal que foi comparada com a representação que teve o ADN para a neurobiologia.
O que incrementou enormemente o interesse pelos neurónios em espelho foi o facto de que eles não se excitam apenas quando o sujeito observa actos motores realizados por outras pessoas, mas também quando observa expressões faciais ou escuta tonalidades vocais que manifestam emoções.
Actualmente começa-se a falar mais em “sistema em espelho” do que em neurónios espelho, pois parece que todo o cérebro faz parte deste sistema.
Gallese, Eagle e Migone (2007) falam em simulação incorporada como o processo que faz com que quando percebemos os gestos e as expressões faciais dos outros, ou escutamos o tom da sua voz, compreendemos a emoção que o outro está a experimentar, não por inferência ou analogia, mas directamente, uma vez que se produz em nós – automática e inconscientemente – um estado corporal que compartilhamos.
Em todas as esferas dos processos mentais – emoções, sensações e intenções – que sejam expressas através de actos intencionais, de expressões faciais ou da linguagem, a percepção activa nos observadores, mediante os neurónios em espelho, os mesmos circuitos neuronais que se activam no sujeito observado. Ou seja, o cérebro do observador reproduz aquilo que está a observar, estabelecendo-se assim, uma linha directa de comunicação entre sujeitos.
Merece ser salientado que os neurónios em espelho do observador não só reproduzem um acto motor, se for o caso, mas também codificam a intenção do acto, de forma que a programação neuronal no cérebro do observador cumpre-se até ao final mesmo que os últimos movimentos do acto se produzam fora do campo de visão.
O conhecimento do papel dos neurónios espelho na comunicação humana permite-nos entender muitas coisas que até alguns anos permaneciam no terreno da especulação. Entre elas estava a antiga intuição de Freud (1912) sobre a comunicação entre o inconsciente do paciente e o inconsciente do analista, o qual chegou a ser pensado como sendo telepatia.
Pelo que foi referido, sabemos que experimentar uma emoção ou observar a expressão da mesma emoção experimentada por outros excita, graças ao sistema em espelho do cérebro, os mesmos circuitos neuronais e, portanto, o observador está a viver no seu interior a mesma emoção, ainda que de maneira inconsciente. É isto que nos permite falar em empatia.
Portanto, em psicoterapia o conteúdo da comunicação do paciente e a matiz emocional transmitida através da sua voz, suas expressões faciais e gestos, estimulam imediatamente no analista/terapeuta – por simulação incorporada – os circuitos neuronais correspondentes e viverá, ainda que seja a um nível menor de intensidade subliminar ou inconsciente, as mesmas emoções que o paciente. Como é evidente, as emoções do analista que de alguma forma se transmitem através das suas respostas, tom de voz, prosódia, silêncios, atitudes e expressões faciais quando se trabalha face a face, provocam também no paciente uma simulação incorporada, de forma que se produz um ininterrupto feedback emocional entre um e outro.
Tudo isto tem, naturalmente um efeito terapêutico. Graças à simulação incorporada o analista experimenta uma emoção similar à que lhe é transmitida, mas à sua maneira, já que nem o seu cérebro nem o conjunto das suas experiências e aprendizagens são idênticas às do paciente. Portanto, em virtude deste feedback, o paciente receberá do analista uma simulação incorporada que será uma versão modificada da sua própria experiência, a qual terá um efeito regulador do seu estado emocional. A repetição contínua deste efeito regulador durante o processo terapêutico dá lugar a modificações significativas.
Adaptado de Joan Coderch
“La prática de la psicoterapia relacional”
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