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Auto-suficiência: o outro lado

– Ninguém sabe como eu me sinto, ninguém se interessa…
– Já disseste a alguém como te sentes?

A expectativa de que os outros saibam como nos sentimos sem termos de o expressar, na maioria das vezes, não se concretiza.

A narrativa acaba por ser: “Não se interessam, não gostam de mim …”

O desejo de ser compreendido e que o outro venha ao nosso encontro sem necessidade de o expressarmos encontra paralelo na infância precoce onde a mãe antecipa os desejos/necessidades da criança e as satisfaz. Excluindo este “fenómeno” que resulta de uma profunda ligação mãe-bebé (que se desfaz gradualmente), a criança vai desde o início manifestando as suas necessidades e procurando pelos meios que dispõe que elas sejam satisfeitas.

Quando as coisas não correm bem nesta fase do desenvolvimento, a criança – amanhã adulto – vai-se fechando sobre si própria e reforçando a crença que pode, essencialmente, contar consigo mesma.

Se para algumas pessoas é difícil pedir ajuda, para outras isso é quase impossível. Sentem que pedir é uma espécie de pedinchar, sinónimo de pequenez, e nesse sentido, exposição de uma falha, de uma fragilidade que é necessário ocultar.

Quando pedem ajuda fazem-no de uma forma tão atabalhoada que por vezes mais parece que os outros é que sentem necessidade de os ajudar.

O receio de pedir e não receber não só expõe o sentimento de insuficiência como o pode ampliar.

Então, numa espécie de vitória invertida aguentam estoicamente em silêncio ao mesmo tempo que desenvolvem sentimentos hostis em relação ao outro que “não se interessa”.

Desta forma vai-se ampliando a distância, quando a proximidade é – e sempre foi – o maior desejo.

No colo aprendi a amar

Num post anterior dei conta de um estudo da FPCE-UC onde se concluía que: “Brincar 10 minutos diários com os filhos em idade pré-escolar, sem direito a fazer mais nada em simultâneo, e de forma cooperativa, contribui para reduzir os distúrbios de comportamento, como p. ex., hiperatividade, défice de atenção, oposição (a criança opõe-se a qualquer ordem do adulto) e desafio e agressividade.”

Agora surge um estudo desenvolvido no Japão pelo Dr. Kumi Kuroda (Riken Brain Science Institute) com resultados, passe a ironia, absolutamente inesperados: os bebés acalmam quando são colocados no colo.

Durante décadas os pais foram bombardeados com dezenas de teorias estapafúrdias que ensinavam a cuidar dos filhos. Os especialistas na matéria, pediatras e psicólogos, venderam milhares de livros “revolucionando” a forma de educar. Técnicas para lidar com choros, birras, (etc.), foram desenvolvidas com base em preconceitos (e muita ciência, sempre muita ciência) e, invariavelmente, descentrando-se do principal: – A Criança .

Resultado: os pais perderam a espontaneidade e a sua capacidade instintiva de cuidar (que passa de pais para filhos).

Em vez de se desenvolver um vínculo seguro através do estabelecimento de uma boa relação – objectivo primeiro -, instrumentalizou-se a relação humana precoce.

É um exagero dizer que os inúmeros diagnósticos de hiperactividade estão relacionados com este tipo de relação, até porque muitos desses diagnósticos estão errados, mas como a sabedoria popular nos ensina: “quem semeia ventos colhe tempestades”.

Nunca imaginei poder dizer que estes estudos são muito bem-vindos, nem imaginei, sequer, que fossem desenvolvidos e que tivessem esta divulgação. Mas eles aí estão, para nos mostrarem o que já sabíamos.

Um entristecido adeus à infância. Pedro Martins Psicoterapeuta - Psicoterapia

Um Entristecido Adeus à Infância

Crescer é abdicar dos sonhos de infância e aceitar o nosso passado com todas as imperfeições que possa ter tido. É viver entre um entristecido adeus à infância – ou seja, a si mesmo e aos objectos do passado – e à superação gradual, ansiosa e esperançada, de muitas barreiras até à entrada no desconhecido mundo da vida adulta.

 

Na adolescência dá-se um corte com as ligações da infância e com a dependência dos pais.

 

O jovem estabelece novos vínculos e adquire capacidade para novas experiências afectivas e sexuais. Desidealiza as figuras parentais e procura novos modelos exteriores.

Na adolescência – onde se vivenciam estados afectivos de luto e paixão – dá-se um corte com as ligações da infância e com a dependência dos pais.

Para além da mudança de objecto de amor, há também mudança de objectivos.

Os interesses deixam de ser quase exclusivamente narcísicos (característicos da infância) para passarem a ser sociais.

O desejo de parar o tempo, a mudança, pode ser considerada uma excepção, que se deve, essencialmente, a uma incapacidade de enfrentar o novo.

No desenvolvimento normal, em contraposição à tendência de manutenção do estado original de fusão, há um impulso à diferenciação e individuação que visa a aquisição e estabelecimento da identidade.

Impossibilitado da fazer a “passagem”, o jovem em desenvolvimento fica amarrado às coisas conhecidas e controláveis (próprias do universo infantil) que produzem um sentimento de segurança.

 

No desenvolvimento normal prevalece a expectativa de uma independência com realizações pessoais e prazeres por satisfazer.

 

Aqueles que não podem desfrutar das coisas transitórias da vida (como acontece na evolução), perder umas para se ganhar outras, são os que na sua história pessoal sentiram as mudanças de forma catastrófica, ao ponto de predominarem os sentimentos de angústia e vivências de perda.

Perante o choque entre forças progressivas e regressivas prevalece a expectativa de uma independência com realizações pessoais e prazeres por satisfazer ao abrigo de uma genitalidade crescente e desejante como impulso para a independência e liberdade.

O desejo que a criança tem de ocupar o lugar do adulto (o lugar entre os adultos) pode finalmente ser realizado, elaborando os sentimentos de perda e deixando-se capturar e fascinar pelos encantos do novo.

Saúde Mental

Um dia, a mãe do Miguel, preocupada porque o via muitas vezes triste, perguntou-lhe:

– O que é que tens, Miguel, o que se passa contigo?
– Não me apetece viver – respondeu o miúdo.
A mãe, surpreendida com aquela resposta assim tão inesperada, e ao mesmo tempo tão directa, tão verdadeira perguntou-lhe:
– Porque é que não te apetece viver?
– Porque não gosto de mim – respondeu o Miguel.

Contou-me a mãe mais tarde que às vezes, quando estava sozinha com ele e o via triste, perguntava-lhe porque ele estava triste, e o Miguel respondia-lhe, naquela sua maneira directa e verdadeira de sempre: – Já sabe o que é, é sempre pela mesma razão, não gosto de mim.

João dos Santos – O que é importante é que isso que o Miguel sente e diz, revela uma grande saúde mental da parte dele. Para nós, psicanalistas, a saúde mental não consiste num indivíduo ser sólido assim como o granito, ou rígido como uma estátua. A saúde mental consiste na pessoa ser capaz de se movimentar livremente dentro de si, e os movimentos de tristeza são tão importantes como os movimentos de alegria.

In “João dos Santos – Se não sabe porque é que pergunta?
conversas com João Sousa Monteiro.”

 

O grande especialista em crianças é a mãe. Pedro Martins Psicoterapeuta - Psicoterapia

O Grande Especialista em Crianças é a Mãe

D. Winnicott, autor do conceito de mãe suficientemente boa, refere que esta é uma mãe atenta e capaz de se adaptar activamente às necessidades do seu filho-

Mas ao mesmo tempo, é capaz de frustrar criando uma desilusão gradativa necessária ao desenvolvimento.

“Com o tempo, o bebé começa a precisar da mãe para ser mal sucedido na sua adaptação (…). Para uma criança, seria muito aborrecido continuar a vivenciar uma situação de omnipotência quando ela já dispõe de mecanismos que lhe permitem conviver com as frustrações e as dificuldades do seu meio ambiente.”

Com a proliferação de estudos e livros publicados sobre bebés e crianças as mães podem ficar confusas e a enfraquecer a conexão emocional com os filhos.

Nunca tivemos acesso a tanta informação como agora. Livros, sites, artigos, blogs, cursos, terapeutas, etc.

Apesar desta lista interminável os pais parecem cada vez mais inseguros e ansiosos em relação aos seus papéis.

Para cada dúvida existe um milhão de respostas, parte delas contraditórias.

O conhecimento que poderiam adquirir nessas leituras por vezes gera mais ansiedade do que tranquilidade.

Em grande medida a educação é a transmissão de um modelo que existe em cada um de nós.

A expressão “mãe suficientemente boa” implica a ausência de um imperativo de perfeição.

A mãe aprendeu muito mais pelo facto de já ter sido criança – de ter observado outros pais com os seus filhos, de ter brincado (fantasiado) aos pais e às mães -, do que poderá aprender com este tipo de livros.

Para além do mais, é possível que a espessa camada de informações impeça os pais de serem eles mesmos; e só quando se desprendem dessa quantidade de “instruções” conseguem envolver-se mais profundamente com os filhos.

À medida que a ansiedade diminui as mães têm mais consciência das suas capacidades e qualidades, e dessa forma, conseguem tirar mais proveito da informação disponível, conservando a conexão emocional.

A expressão “mãe suficientemente boa” implica a ausência de um imperativo de perfeição.

Ao mesmo tempo, o reconhecimento que a mãe faz das suas imperfeições deve constituir algo mais libertador do que opressivo.

A mãe já foi filha, e por isso trás consigo recordações de tê-lo sido e de ter sido cuidada por uma mãe, e estas lembranças tanto podem ajudá-la como atrapalhar na sua experiência como progenitora.

No entanto, só muito excepcionalmente, encontramos mães que por graves perturbações são incapazes de cuidar dos filhos ao ponto de os colocar em risco.

Felizmente todas as mães falham, amam os seus filhos mas não são perfeitas, e por isso não conduzem os seus filhos para um mundo falso e delirante.

João dos Santos – Breve história ilustrada

João dos Santos foi o criador da moderna Saúde Mental Infantil em Portugal e o grande impulsionador da viragem da Psiquiatria Infantil que de uma especialidade enraizada na Psiquiatria de adultos passou a uma especialidade autónoma.

Foi um dos primeiros psicanalistas portugueses e um dos fundadores da Sociedade Portuguesa de Psicanálise.

Desenvolveu um olhar novo sobre o valor da arte no desenvolvimento da criança e sobre a educação na família, na escola e na comunidade, criando concepções e ensinamentos originais e modos inovadores de formação de pais e professores.

O seu percurso académico e a sua sólida formação em Psiquiatria e Psicanálise permitiram-lhe proceder a rigorosas pesquisas sobre a criança. João dos Santos criou uma obra escrita inovadora concretizada numa obra institucional em prol da protecção materno-infantil e da prevenção e intervenção em Saúde Mental Infantil. Obra que ainda hoje ajuda a compreender as causas mais profundas do sofrimento psíquico e das patologias da criança, do adolescente e do jovem.

João dos Santos começou por ser professor de Educação Física, licenciou-se depois em Medicina, tendo logo orientado o seu interesse e formação para a Psiquiatria. Trabalhou com Vítor Fontes no Instituto António Aurélio da Costa Ferreira e com Barahona Fernandes no Hospital Júlio de Matos onde foi um dinamizador incansável da modernização das clínicas infantis.

Partiu para Paris em 1946 onde sob a orientação de Henri Wallon foi investigador no Centro de Pesquisas Científicas de França (C.N.R.S.) no Laboratório de Biopsicologia da Criança. Trabalhou com G. Heuyer, J. Ajuriaguerra, H. Ey, A. Thomas. Trabalhou também no Serviço de G. Heuyer, primeiro professor de Neuropsiquiatria de França, no Hospital “Enfants Malades” e no Centro Alfred Binet, dirigido por Serge Lebovici. Aqui, entre outros, trabalhava também René Diatkine que seguia como Lebovici as novas correntes psicodinâmicas e se tornaram psicanalistas. Lebovici foi o pioneiro da Psicanálise infantil em França.

João dos Santos criou, com colaboradores, a secção de Higiene Mental do Centro de Assistência Materno-infantil Sofia Abecassis, o Colégio Eduardo Claparède, os dois primeiros Centros Psicopedagógicos portugueses, um na Voz do Operário outro no Colégio Moderno, o Centro Infantil Helen Keller, a Liga Portuguesa de Deficientes Motores, a Associação Portuguesa de Surdos, a Liga Portuguesa contra a Epilepsia. Colaborou na criação do Centro de Saúde Mental Infantil de Lisboa de que foi o seu primeiro director. Aí existiram desde o início, equipas de serviço ambulatório no Dispensário Central e no Dispensário do Hospital Dona Estefânia, além da equipa das clínicas infantis do Hospital Júlio de Matos. Mais tarde foram criados outros serviços como o Laboratório de Electroencefalografia, Laboratório de Bioquímica, a Escola dos Cedros – serviço de adolescentes, a Casa da Praia – Externato de Pedagogia Experimental e a Unidade de Primeira Infância (UPI).

João dos Santos foi o inspirador da criação do Instituto de Apoio à Criança (IAC).

Foi Professor na Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação e na Escola Nacional de Saúde Pública.

Em 1984 foi agraciado pelo Presidente da República, General António Ramalho Eanes, com o grau de Comendador da Ordem de Benemerência.

Em 1985, a Faculdade de Motricidade Humana atribuiu a João dos Santos o título de Doutor Honoris Causa.

 

Paula Santos Lobo e Luís Grijó dos Santos

 

Documentário de 1985, numa cópia digitalizada em muito mau estado

 

Donald Winnicott

Winnicott era filho de Elizabeth Martha (Woods) Winnicott e do Sr. John Frederick Winnicott, um comerciante que se tornou cavaleiro em 1924 após servir duas vezes como prefeito de Plymouth.

A família era próspera e aparentemente feliz, mas atrás desse verniz, Winnicott se viu como oprimido por uma mãe com tendências depressivas como também por duas irmãs e uma babá. Foi a influência do seu pai, que era um livre-pensador e empreendedor que o encorajou em sua criatividade. Winnicott se descreveu como um adolescente perturbado, reagindo contra a própria auto-repressão que adquirindo sua capacidade de cuidar ao tentar suavizar os sombrios humores de sua mãe. Estas sementes de autoconsciência se tornaram a base do interesse dele trabalhando com pessoas jovens e problemáticas.

Decidindo se tornar um médico, ele começou a estudar medicina em Cambridge mas interrompeu seus estudos para servir como cirurgião aprendiz – residente em um navio (destroyer) britânico, o HMS Lúcifer, durante a Primeira Guerra Mundial. Ele completou sua formação em medicina em 1920 e em 1923, no mesmo ano do seu primeiro casamento com Alice Taylor, foi contratado como médico no Paddington Green Children’s Hospital em Londres. Foi também em 1923, que Winnicott iniciou sua análise pessoal com James Strachey (1887 – 1967), o tradutor das obras de Sigmund Freud para o inglês.

Em 1927 Winnicott foi aceito como iniciante na Sociedade Britânica de Psicanálise, qualificado como analista em 1934 e como analista de crianças em 1935. Ele ainda estava trabalhando no hospital infantil e posteriormente comentou que… ”naquele momento nenhum outro analista era também um pediatra, assim durante duas ou três décadas eu fui fenômeno isolado…” O tratamento de crianças mentalmente transtornadas e das suas mães lhe deu a experiência com a qual ele construiria a maioria das suas originais teorias. E o curto período de tempo que ele poderia dedicar-se a cada caso o conduziu ao desenvolvimento das suas “inter – consultas terapêuticas.” outra inovação da prática clínica que introduziu.

Durante os anos de guerra trabalhou como consultor psiquiátrico de crianças seriamente transtornadas que tinham sido evacuadas de Londres e outras cidades grandes, e separado de suas famílias. Ele continuou trabalhando ao Paddington Green Children’s Hospital nos anos 1960.

Passada a guerra, Winnicott tornou-se um médico contratado do Departamento Infantil do Instituto de Psicanálise, onde trabalhou durante 25 anos. Foi presidente da Sociedade Britânica de Psicanálise por duas gestões, membro da UNESCO e do grupo de experts da OMS. Atuou como professor no Instituto de Educação e na London School of Economics, da Universidade de Londres. Dissertou e escreveu amplamente como atividade profissional independente.

Via Wikipedia

 

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