Luto – O que não se deve dizer
O luto é uma parte inevitável da vida; a cada minuto 108 pessoas morrem no mundo inteiro. O que fazer quando alguém de quem gostamos sofreu uma perda? Não é fácil responder, e para além do mais, não existe uma maneira específica de lidar com estas coisas.
O psicanalista Robert Stolorow, em entrevista à Thrive Global refere que a nossa estratégia padrão para abordar estas situações propõe o oposto daquilo que as pessoas realmente precisam.
Na entrevista que podemos ler abaixo, Stolorow refere que as pessoas não precisam de ser consoladas na sua dor tanto quanto necessitam aproximar-se dela e que não há cronograma para o luto.
THRIVE GLOBAL: Escreveu que não devemos dizer a alguém que tenha experimentado uma perda traumática “deixa-o ir e segue em frente”. Porquê?
ROBERT STOLOROW: Se você diz a alguém para seguir em frente, basicamente, você está a rejeitar a dor emocional dessa pessoa, dizendo: “Ok, basta, acabou, não quero fazer parte disso”. Você está a rejeitar o que a pessoa mais precisa, o que eu chamo de “espaço relacional” para essa dor emocional. É isso que eu tento fazer quando trabalho com pacientes traumatizados. É um pouco o oposto do que as pessoas bem-intencionadas fazem intuitivamente, tentando fazer as pessoas sentirem-se melhor.
TG: Porque é que isso é útil?
RS: Compartilhar a dor e oferecer um lugar para ela pode ajudar a torná-la mais suportável. Pode não diminuir muito a dor, mas ao existir um espaço onde a dor é permitida e onde pode ser compartilhada, ela torna-se mais suportável.
“O Luto é uma forma de Amor”
O que é realmente importante sobre ser capaz de encontrar um espaço para o sofrimento é que o luto é na verdade uma forma de amor. A dor é a forma que o amor toma quando um ente querido morre.
TG: Fale-me mais sobre isso.
RS: A magnitude do sofrimento corresponde à profundidade do amor pela pessoa perdida. É um aspecto extremamente importante da vida emocional de alguém – ser capaz de sofrer-, porque ser capaz de sofrer é uma forma de ser capaz de amar. Amar torna cada um de nós vulnerável ao desgosto amoroso.
TG: A palavra ” finitude” – A noção de Martin Heidegger de que a existência humana está inevitavelmente envolvida na temporalidade e na morte – surge muito na sua escrita.
RS: Tento tomar o conceito de finitude de Heidegger e torná-lo mais relacional. Não é apenas a nossa própria finitude que é a fonte da ansiedade existencial; É a finitude dos outros, de todos aqueles com quem nos preocupamos e amamos. Em certo sentido, a menos que estejamos completamente isolados emocionalmente dos outros, somos sempre vulneráveis à dor da perda incorporada numa existência finita.
TG: É algo de que nos devíamos tentar livrar?
RS: Definitivamente não. Tendo passado por uma perda terrível há anos, e já tive outra desde então, ser enlutado faz parte da minha identidade. É parte de quem eu sou. Eu acho que posso ajudar muito as pessoas por causa disso – eu não tenho que fugir disso, não preciso evitá-lo, não preciso fugir disso.
TG: Tenho curiosidade pelo trauma menos agudo, onde não há um único acontecimento terrível, mas algo mais ambiental ou a longo-prazo, como o abuso ou a negligência nas relações familiares.
A teoria do apego diz-nos que, como adultos, as pessoas que cresceram com pais ansiosos ou emocionalmente distantes serão atraídas por essas mesmas dinâmicas nos seus relacionamentos amorosos. Como é que o seu trabalho pode ajudar a processar a dor de uma infância tóxica?
RS: Eu acho que é preciso ter mais detalhes sobre a dureza dessa infância. Uma das razões pela qual uma pessoa com uma infância tóxica pode sentir-se atraída por pessoas indisponíveis é que a pessoa está a tentar dominar dores antigas e sair delas de forma diferente. Esse é um dos motivos.
TG: Existe um tempo “normal” para a duração do período de luto?
RS: Eu penso que o conceito de normalidade está errado em relação à perda. Quanto mais profundo o amor, maior o sofrimento e talvez nunca termine. Eu acho que há casos em que as pessoas levam o luto até ao seu próprio túmulo. Eu sei que algumas pessoas escreveram sobre estágios de luto. Tenho a sensação de que isso é conversa fiada.
TG: Porquê?
RS: Faz-se uma espécie de cronograma universal para o processo de luto, e não se leva em conta a natureza da relação de amor perdida. O sofrimento varia dependendo da natureza da relação que se perdeu. O sofrimento tem sido patologizado. Quando você patologiza o sofrimento você está patologizar o amor.
Traduzido/adaptado por Pedro Martins
a partir de “Why you should never tell someone who’s grieving to Move On”
Entrevista a Robert Stolorow
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