Depressão, Depressividade e Depressibilidade
1 – Existe uma depressão – dita “reactiva” – que é a depressão normal ou fenómeno do luto:
– Corresponde à perda de alguém significativo.
Neste caso falamos de DEPRESSIBILIDADE: qualidade de se poder deprimir, de ser capaz de fazer um trabalho de luto – o que é um sinal de boa saúde mental.
2 – Falamos em DEPRESSÃO patológica quando os laços afectivos são predominantemente narcísicos.
Assim, verifica-se uma intolerância e uma susceptibilidade particularmente intensas à perda do amor e protecção desse outro fundamental.
Como a relação com o outro é de tipo funcional ou complementar – um instrumento ou prolongamento do próprio -, o sujeito sente, ao perdê-lo, que se destaca e afasta uma parte essencial de si mesmo.
3 – A DEPRESSIVIDADE diz respeito ao esforço defensivo continuo para não se deixar deprimir: ficar deprimido (abatido), ou deprimir-se (sentir-se triste e com sentimentos de solidão) devido a uma perda.
Podemos dizer que são pessoas que jogam à defesa; quanto muito, ao contra-ataque.
O medo é grande, e por isso, a batalha, quando possível, quase sempre evitada.
As depressões manifestas que estes sujeitos apresentam são curtas (ainda que frequentes).
Por um lado, a sua fraqueza não lhes permite correrem o risco de sentirem verdadeiramente a perda de alguém.
A depressividade não é, propriamente, uma depressão:
– O que domina o estado afectivo não é a tristeza e o sentimento de perda, mas um mal-consciencializado sentimento de dependência e opressão.
Um receio de ficar só, uma incapacidade de se visualizar autónomo – numa palavra, uma impossibilidade de verdadeiramente se deprimir, ou seja, de aceitar a perda.
“A depressividade remete para um estado permanente e a depressibilidade para um estado temporário/transitório.”
A depressividade não é, em rigor, um estado de humor, mas uma disposição de fundo – a disposição depressiva; é-se (ou não) depressivo.
Na depressividade falamos em “ser” e na depressão normal em “estar”.
A depressividade remete para um estado permanente e a depressão normal para um estado temporário/transitório.
A relação do depressivo é constantemente ambitendente; quer, e não quer.
O relacionamento oscila entre a submissão e a revolta: uma jamais aceite; a outra, nunca completamente assumida.
“Depressibilidade: Os depressíveis são aqueles que se podem deprimir”
Há, por outro lado, aqueles que sabem e podem perder:
– Fazem o luto do que desapareceu e investem novamente, reparando facilmente a perda narcísica.
É o que designámos no ponto 1 por DEPRESSIBILIDADE (aqueles que são depressíveis, ou seja, que se podem deprimir).
Realizam lutos normais aquando da perda:
– Pois não estão excessivamente dependentes do outro (patologicamente afeiçoados);
– Nem o outro é detentor de partes importantes do Self, arrastando no seu naufrágio partes do próprio.
E este último é um motivo de relevo:
Na personalidade depressiva, o outro é, em grande medida, um prolongamento, um complemento da pessoa – por isso a sua perda é tão dolorosa e incapacitante, deixando uma ferida aberta que equivale a uma verdadeira amputação do próprio.
Acresce que a personalidade normal (o tal depressível) tem uma compleição narcísica razoavelmente sólida, uma auto-imagem suficientemente boa, uma auto-estima capaz de suportar sem afundamento do valor próprio as lesões narcísicas que, mesmo independentemente da acção dos outros, a vida vai provocando: perdas de prestígio, de capacidades, de funções, de situações sociais ou económicas, o envelhecimento, etc., etc., que são inerentes a toda a existência individual.
Bibliografia: Matos, A. C. (2001). A Depressão. Lisboa: Climepsi Editores
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