Conquistar o Amor da Mãe Narcisista
A criança não para de multiplicar as suas proezas na tentativa de merecer pelos seus dons, o amor da mãe narcisista.
Mas este amor é sempre insatisfatório, já que nunca é dirigido para ela mesma, por ela mesma – mas apenas para aquilo que a filha representa, ou seja, a imagem idealizada da mãe.
O “dom” da criança resulta, pois, da sua capacidade, excepcionalmente desenvolvida, de responder às expectativas da mãe abusiva.
Essa insegurança afectiva, essa falta de amor engendra por sua vez uma fuga para a frente em performances cada vez mais elaboradas porque a criança nunca cessa de tentar merecer esse amor que jamais chega até ela, já que não lhe está destinado.
Por norma são adolescentes, muitas vezes brilhantes, mas sempre ávidas de satisfações narcisistas, alternando períodos de excitação e depressão, de hiperactividade e de passividade.
Sempre desejosas de agradar, mas geralmente pouco amadas, às vezes com distúrbios alimentares, e ao mesmo tempo preocupadas com as suas formas.
Afectivamente imaturas mas sexualmente experientes.
Este é o destino da menina quando a sua mãe, esquecida da sua própria identidade de mulher, a encarregou de realizar as suas aspirações no seu lugar.
O que ocorre com as mães “mais mães que mulheres” diante da autonomização das filhas?
As mães designadas de “possessivas” ou “fusionais” percebem o momento em que as filhas se vão emancipar e voltar-se para outras fontes de gratificação:
Primeiro as amigas e depois os homens, preencherão uma aspiração que a mãe, por mais amorosa que seja, não consegue satisfazer.
Pois a filha enquanto mulher, enquanto ser sexuado, já não é a filha criança.
É essa diferença que as mães têm dificuldade em admitir, isto é, integrar na relação, mesmo se, em teoria, elas o saibam muito bem.
A mãe tenta reter e a filha tenta sair. E desta saída depende a sua sobrevivência psíquica.
Excluídas da vida social e amorosa das filhas tentam adiar esse momento funesto separando-as do mundo.
Imiscuem-se nas relações das filhas e dessa forma manter o controlo sobre elas. Com a boa intenção, é claro, de não deixar a filha perder-se.
Também a filha vive dolorosamente a perda daquilo que era um encantador idílio.
Mas somente enquanto ela jogou o jogo, enquanto foi objecto passivo, o brinquedo consciente de uma mãe abismada na maternidade.
Agora a filha já não está na infância mas a escrever a sua história, e com necessidade de avançar a todo o custo. Cortar os laços e estabelecer outros.
É importante referir que existe o perigo de nos novos laços a filha da mãe narcisista recriar a fusão e a simbiose com o parceiro.
É muito difícil fazer o corte com esta mãe para se tornar mulher e muitas nunca o conseguem fazer na totalidade devido à falta de modelo.
Não basta crescer e tornar-se adulto para se libertar da relação com a mãe narcisista
Ou seja, estas mães só mostraram à filha o que é ser mãe mas ficou um vazio quanto ao ser mulher.
As que o conseguem não deixam de se debater com grandes sentimentos de culpa: “como é que se pode abandonar uma mãe que nos ama tanto?”
A culpa faz a sua parte: a filha renuncia a deixar a mãe e viver por conta própria, hipotecando a sua liberdade e as possibilidades de ser feliz.
Que enorme ingratidão seria deixar a mãe que tudo lhe deu e continua a viver só para ela!
Só uma filha desnaturada não reconhece a grandeza do amor da sua mãe.
A mãe tenta reter e a filha tenta sair. E desta saída depende a sua sobrevivência psíquica.
A filha empurra para o futuro, a mãe puxa para o passado.
Mas elas não estão numa posição simétrica no que diz respeito à fronteira entre a infância e a idade adulta, que é a adolescência.
A mãe tem a norma social que encoraja as mães a serem totalmente mães.
De modo que a filha tem contra si o peso da norma que ela internalizou em forma de amor pela sua mãe, de gratidão, de dependência, e quando procurou escapar, de culpa.
As posições não são, portanto, em nada simétricas: à consciência limpa da mãe corresponde a consciência pesada da filha.
Com efeito, não basta crescer e tornar-se adulto para se libertar da relação mãe-filha.
No pior dos casos a filha cede e renúncia à saída, pelo menos temporariamente.
No melhor, deixa de ser a criança-de-sua-mãe e realizará o seu destino de mulher.
Bibliografia: Meres-Filles ; Une Relation A Trois – Caroline Eliacheff e Nathalie Heinich
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