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Conquistar o Amor da Mãe Narcisista - Pedro Martins Psicólogo Clínico Psicoterapeuta

Conquistar o Amor da Mãe Narcisista

A criança não para de multiplicar as suas proezas na tentativa de merecer pelos seus dons, o amor da mãe narcisista.

Mas este amor é sempre insatisfatório, já que nunca é dirigido para ela mesma, por ela mesma – mas apenas para aquilo que a filha representa, ou seja, a imagem idealizada da mãe.

O “dom” da criança resulta, pois, da sua capacidade, excepcionalmente desenvolvida, de responder às expectativas da mãe abusiva.

Essa insegurança afectiva, essa falta de amor engendra por sua vez uma fuga para a frente em performances cada vez mais elaboradas porque a criança nunca cessa de tentar merecer esse amor que jamais chega até ela, já que não lhe está destinado.

Por norma são adolescentes, muitas vezes brilhantes, mas sempre ávidas de satisfações narcisistas, alternando períodos de excitação e depressão, de hiperactividade e de passividade.

Sempre desejosas de agradar, mas geralmente pouco amadas, às vezes com distúrbios alimentares, e ao mesmo tempo preocupadas com as suas formas.

Afectivamente imaturas mas sexualmente experientes.

Este é o destino da menina quando a sua mãe, esquecida da sua própria identidade de mulher, a encarregou de realizar as suas aspirações no seu lugar.

O que ocorre com as mães “mais mães que mulheres” diante da autonomização das filhas?

As mães designadas de “possessivas” ou “fusionais” percebem o momento em que as filhas se vão emancipar e voltar-se para outras fontes de gratificação:

Primeiro as amigas e depois os homens, preencherão uma aspiração que a mãe, por mais amorosa que seja, não consegue satisfazer.

Pois a filha enquanto mulher, enquanto ser sexuado, já não é a filha criança.

É essa diferença que as mães têm dificuldade em admitir, isto é, integrar na relação, mesmo se, em teoria, elas o saibam muito bem.

 

A mãe tenta reter e a filha tenta sair. E desta saída depende a sua sobrevivência psíquica.

 

Excluídas da vida social e amorosa das filhas tentam adiar esse momento funesto separando-as do mundo.

Imiscuem-se nas relações das filhas e dessa forma manter o controlo sobre elas. Com a boa intenção, é claro, de não deixar a filha perder-se.

Também a filha vive dolorosamente a perda daquilo que era um encantador idílio.

Mas somente enquanto ela jogou o jogo, enquanto foi objecto passivo, o brinquedo consciente de uma mãe abismada na maternidade.

Agora a filha já não está na infância mas a escrever a sua história, e com necessidade de avançar a todo o custo. Cortar os laços e estabelecer outros.

É importante referir que existe o perigo de nos novos laços a filha da mãe narcisista recriar a fusão e a simbiose com o parceiro.

É muito difícil fazer o corte com esta mãe para se tornar mulher e muitas nunca o conseguem fazer na totalidade devido à falta de modelo.

 

Não basta crescer e tornar-se adulto para se libertar da relação com a mãe narcisista

 

Ou seja, estas mães só mostraram à filha o que é ser mãe mas ficou um vazio quanto ao ser mulher.

As que o conseguem não deixam de se debater com grandes sentimentos de culpa: “como é que se pode abandonar uma mãe que nos ama tanto?”

A culpa faz a sua parte: a filha renuncia a deixar a mãe e viver por conta própria, hipotecando a sua liberdade e as possibilidades de ser feliz.

Que enorme ingratidão seria deixar a mãe que tudo lhe deu e continua a viver só para ela!

Só uma filha desnaturada não reconhece a grandeza do amor da sua mãe.

A mãe tenta reter e a filha tenta sair. E desta saída depende a sua sobrevivência psíquica.

A filha empurra para o futuro, a mãe puxa para o passado.

Mas elas não estão numa posição simétrica no que diz respeito à fronteira entre a infância e a idade adulta, que é a adolescência.

A mãe tem a norma social que encoraja as mães a serem totalmente mães.

De modo que a filha tem contra si o peso da norma que ela internalizou em forma de amor pela sua mãe, de gratidão, de dependência, e quando procurou escapar, de culpa.

As posições não são, portanto, em nada simétricas: à consciência limpa da mãe corresponde a consciência pesada da filha.

Com efeito, não basta crescer e tornar-se adulto para se libertar da relação mãe-filha.

No pior dos casos a filha cede e renúncia à saída, pelo menos temporariamente.

No melhor, deixa de ser a criança-de-sua-mãe e realizará o seu destino de mulher.

 

Bibliografia: Meres-Filles ; Une Relation A Trois – Caroline Eliacheff e Nathalie Heinich

 

Rebelião e Desobediência nos Adolescentes Pedro Martins Psicoterapeuta Psicólogo Clínico

Rebelião e Desobediência nos Adolescentes

Por que é que os adolescentes discutem tanto e como é que os pais devem reagir?

À medida que os pré-adolescentes entram na adolescência, expande-se a sua capacidade de raciocinar como um adulto e de fazer escolhas.

Ao mesmo tempo, entram no período de “separação-individuação” e de formação de uma “identidade adulta independente”. Ambas as tarefas podem levar a uma enorme frustração e angústia dos pais.

Segundo Nadine Medlin:

“A separação-individuação psicológica é o processo pelo qual o jovem adulto renegoceia a relação com os pais.

A resolução da crise de identidade envolve a síntese do passado e do presente, uma vez que o adolescente se reintegra de tal forma que permite que o jovem adulto assuma o seu lugar na sociedade.

Ambos os processos são uma parte vital do impulso para um ajustamento pessoal saudável.”

Para concretizar estas tarefas com sucesso, muitos adolescentes iniciam discussões com os pais, muitas vezes por razões triviais.

Isto pode ser especialmente instigador para os adultos, uma vez que não parece existir nenhuma razão por detrás das querelas que ocorrem.

As tentativas de raciocinar com o adolescente quase sempre acabam em fracasso.

Isto tem a ver com as origens do argumento, que se relacionam com o adolescente desenvolver duas competências:

– Afinar as suas capacidades verbais para expressar o seu ponto de vista

– Fazer entender que se trata de um adulto que pode tomar decisões independentes sobre a sua vida

Nenhum deles tem, necessariamente, nada a ver com a resolução de problemas ou conflitos, que tendem ambos a ser o centro das atenções dos pais.

 

Forçar o adolescente a fazer a escolha “correcta” raramente funciona e quase sempre resulta em confrontação.

 

Aceitar que a discussão que está a ter com o seu adolescente é uma actividade necessária pela qual eles têm que passar é muito difícil para uma grande parte dos pais, uma vez que não queremos que eles repitam os erros que cometemos enquanto adolescentes.

Queremos transmitir a nossa experiência, as frustrações que tivemos de suportar nas nossas próprias vidas para alcançar algo.

No entanto, cometer erros de mau julgamento faz parte do nosso crescimento; a função dos pais é tentar impedir que as decisões afectem permanentemente a forma como a vida se desenrola.

Tentar forçar o adolescente a fazer a escolha correcta raramente funciona e quase sempre resulta em confrontação.

As proibições categóricas que funcionavam com crianças mais novas tendem a cair em saco roto com os adolescentes.

Digamos, por exemplo, que o seu filho quer ir a uma festa na casa de um amigo onde os pais estão fora durante o fim-de-semana.

Declarações morais vagas, como “ainda arranjas problemas” ou “algo mau pode acontecer”, não são aceitáveis para o adolescente.

É necessário que os pais pensem através dos seus próprios sentimentos de mal-estar antes de responderem.

O que é que realmente receia que ocorra na casa da outra pessoa? Vai haver bebidas ou drogas? Serão estes receios apenas um reflexo da sua própria adolescência?

Quando você percebe o que realmente o incomoda e em que medida isso diz respeito à sua própria adolescência, então a honestidade é aconselhada.

Diga claramente quais são as suas preocupações morais e por que razão não dará autorização ao seu filho para fazer algo, mas esteja ciente de que isso não significa que haverá uma obediência inquestionável.

 

A função dos pais não é impedir que os filhos adolescentes comentam erros, mas impedir que os erros os afectem de forma permanente.

 

Muito provavelmente haverá protestos tais como “Bem, eu não sou você” ou “Você simplesmente não entende!”

No entanto, se você deu explicações fundamentadas e lógicas que são consistentes com as suas crenças pessoais, então é muito mais provável que o adolescente assinta no cumprimento da sua decisão.

Mesmo que o adolescente argumente para “salvar a face”, aceitará a proibição a um nível mais profundo.

Se usar um tom de voz calmo, tiver considerado os desejos e argumentos do seu filho, e os princípios subjacentes à sua decisão forem consistentes com os valores morais da família, estas coisas são normalmente muito mais importantes do que as próprias palavras.

Lembre-se de que o que você deseja que o adolescente retire da discussão é o processo de tomada de decisão que foi seguido.

É isto que será recordado muito depois de a festa ou outra fonte de discussão ter sido esquecida.

 

Traduzido/adaptado por Pedro Martins

A partir de: “Rebellion and Defiance in Adolescents” – James A. Powell

Imagem de Michael-Pouteyo

Crescer sem psicoterapia - Pedro Martins Psicoterapeuta - Psicólogo Clínico

Crescer Emocionalmente sem Terapia

Crescer emocionalmente é difícil de conseguir por conta própria.

De vez em quando, encontro alguém que parece ter crescido sem terapia, uma pessoa relativamente equilibrada e satisfeita, pouco sobrecarregada com conflitos internos.

Como psicanalista e psiquiatra, interrogo-me sobre isso. Crescer emocionalmente apresenta tantas dificuldades e desafios que ultrapassá-las com sucesso parece uma tarefa assustadora.

Onde é que a criança tem o guia para desenvolver um senso de autonomia pessoal enquanto também desfruta de relacionamentos com as outras pessoas?

Como é que um filho de três ou treze anos descobre como lidar com a inveja que tem dos outros, as questões da sexualidade, os seus desejos destrutivos e vingativos?

Como é que a criança pode saber que a sua dor de estômago representa ansiedade em ir para a escola, ou que sua preocupação com a escola pode servir para distraí-la de preocupações mais sérias sobre fantasias e acontecimentos que surgem em casa?

Há uma razão para que tantos filmes sobre ou para crianças (como o E.T.) retratem os adultos como pessoas que não compreendem o mundo das crianças: há uma certa verdade nisso.

Mesmo os pais mais intuitivos e empáticos não conseguem compreender completamente o mundo interior de uma criança, mesmo que eles já tenham sido crianças.

No entanto, os seus esforços são importantes e os pais costumam ajudar as crianças a aprender, a aceitar, a entender e a regular os seus sentimentos e desejos.

 

É muito difícil vermos os nossos pontos cegos.

 

Mas há sempre sentimentos de vergonha e culpa que as crianças preferem que os pais não conheçam, e sentimentos e fantasias que os pais não conseguem imaginar.

Uma menina de quatro anos pode dizer descaradamente à mãe que planeia casar-se com o pai, mas esconde o quanto ela adoraria fazer desaparecer o irmão mais novo.

Independentemente da forma como a mãe responde, a menina ainda está muito por sua conta, enquanto tenta discernir a fantasia da realidade.

Com pouco conhecimento ou experiência, as crianças são chamadas a lidar com os seus desejos imperiosos e as autocríticas.

Com os seus corpos em mudança e as exigências dos pais e professores, sem mencionar a existência de doenças, tristezas, rejeições de amigos, e golos falhados.

Os pais podem ajudar a crescer emocionalmente (e também podem magoar), mas há sempre muito mais coisas do que aquelas que eles podem controlar.

Com os seus recursos limitados, as crianças passam por fases onde despontam medos, peculiaridades, crenças, rituais e maneiras de se relacionar com o mundo.

Estas adaptações diminuem e fluem, mudam, ficam inactivas e reaparecem.

Todos nós carregamos pelo menos parte dessa bagagem -eu-estou-a-lidar-com-esta-loucura-o-melhor-que-posso-, para a vida adulta, e normalmente queremos deixar conteúdo da bagagem por analisar.

É tão difícil ver os nossos próprios pontos cegos, e surpreendentemente, a maioria de nós deseja ferreamente apegar-se a eles.

 

Mesmo os pais mais intuitivos e empáticos não conseguem compreender completamente o mundo interior de um filho.

 

No meu consultório vejo constantemente pessoas que se casaram para evitar um envolvimento profundo e depois divorciam-se porque o envolvimento não é suficientemente profundo;

ou que, inconscientemente, estão a fazer um esforço tão grande para serem diferentes dos seus pais, que não conseguem fazer com que o relacionamento funcione com um parceiro;

ou que continuam a fazer jogos e a tentar não se vingar de pequenos ou grandes traumas de infância.

Muitas vezes eles dizem-me: “Eu deveria ter vindo vê-lo há vinte anos”, e eu não discordo.

Por que eles não vieram?

Na maioria das vezes, as pessoas transportam os sentimentos desconfortáveis que têm sobre as suas lutas emocionais da infância para o presente.

As pessoas falam sobre o estigma de procurar ajuda para os problemas emocionais, mas o mais importante e omitido “estigma” são sobretudo, as próprias hesitações e as auto-depreciações.

A afirmação “Preciso de ajuda e vou obtê-la” raramente é mal recebida, mas a vergonha de querer ou precisar de ajuda para estas questões é tão grande que poucas pessoas se sentem à vontade para a verbalizar.

 

Como existe muito do passado no presente, mesmo que invisível, os obstáculos emocionais ao trabalho, ao amor e ao lazer são muitos.

 

Quando eu estava na faculdade, tinha tanta vergonha e medo de precisar de terapia como qualquer outra pessoa, mas existiam coisas que me incomodavam e com as quais eu não conseguia lidar.

Naquela altura, ter feito psicoterapia por um curto período de tempo ajudou-me a reconhecer que compreendia muito pouco sobre mim e sobre os meus sentimentos em relação à minha família – um começo muito útil.

Voltar a fazer psicoterapia quando era estudante de medicina ajudou ainda mais.

Durante a formação para psicanalista fiz uma psicoterapia mais longa que me proporcionou uma sensação tremendamente gratificante de finalmente desatar os nós emocionais mais apertados e ocultos.

Que sorte não me ter sentido obrigado a fingir que era maduro a ponto de me privar da ajuda essencial dos outros.

Freud sugeriu que era desejável que as pessoas pudessem amar e trabalhar, e, alguns, acrescentou, brincar.

Podem parecer coisas simples – amor, trabalho e diversão -, mas exigem equilíbrio emocional e flexibilidade, além de percepções realistas de si mesmo e dos outros.

Como existe muito do passado no presente, mesmo que invisível, os obstáculos emocionais ao trabalho, ao amor e ao lazer são muitos.

Embora algumas pessoas de facto atinjam estes objectivos aparentemente simples, mas realmente muito ambiciosos, é muito mais fácil quando alguém nos ajuda a esclarecer certas percepções erróneas.

Em qualquer idade, pode ser difícil crescer emocionalmente, dar o próximo passo no desenvolvimento.

E, os quiproquós no desenvolvimento são resolvidos com muito mais facilidade, e, geralmente, de forma mais profunda, com, do que sem terapia.

No entanto, apesar de existirem outras opções, muitos de nós parecem preferir crescer da maneira mais difícil – sozinhos -.

Traduzido/adaptado por Pedro Martins
a partir de: Growing Up Without Therapy – Lawrence D. Blum

A Depressão na Adolescência - Pedro Martins Psicoterapeuta Psicólogo Clínico.

A Depressão na Adolescência

A depressão adolescentil instala-se habitualmente a meio ou para o fim da adolescência.

Habitualmente, após um período de uma separação-autonomia e individuação insuficientemente assumidas.

São casos em que aparentemente o pré-adolescente se autonomizou, mas durante o qual inconscientemente permanece fortemente ligado à infância.

“Um indivíduo jovem sai da adolescência quando a angústia dos seus pais não produz nenhum efeito inibidor.” F. Dolto

Um dos elementos de diagnose desta pseudo-independência é a ligação que o adolescente estabelece com o círculo relacional próximo da família:

–  Há um desejo de não se afastar, mas apenas de alargar o grupo familiar.

A este período (que se caracteriza por um estado eufórico, de dinamismo e de entusiasmo) de aparente separação da família, às vezes com um distanciamento comportamental evidente e escolha de padrões e valores diferentes dos dos pais, segue-se um período de manifesta regressão aos objectos e objectivos infantis.

Trata-se de um reencontro em novos moldes com a família, na vigência do qual o adolescente, de arisco e rebelde, se torna terno e simpático com os pais.

É quando se apercebe de que está abdicar dos seus projectos mais pessoais, defendendo activamente a submissão ao esquema parental, que o adolescente acorda da ilusão relacional euforizante.

Nessa altura tenta mais decididamente o luto da infância e das imagos parentais e a escolha de um objecto heterossexual verdadeiramente exogâmico e bem marcadamente seleccionado pelo seu desejo próprio, que a depressão autêntica, vivida –e, por vezes, séria – da adolescência se instaura.

Foi-se a alimentada ilusão de um retorno disfarçado à infância.

O caminho da desvinculação do passado e da aventura afirma-se como o mais válido e o único que conduz à realização criativa do homem.

No entanto, a nostalgia do passado, o luto inacabado da infância, a fixação e regressão infantis impedem-no de o trilhar com decisão.

A partir de “Audácia, Narcisismo e Sexualidade” – A. Coimbra de Matos

Porque os pais também devem colocar limites a si próprios. Pedro Martins Psicoterapeuta Psicólogo Clínico

Os pais também devem colocar limites a si próprios

O medo do mundo exterior leva os pais a querer controlar a vida dos filhos. Mas será que os pais não deveriam colocar limites a si próprios?

“Eu não sei com quem meu filho namora, ou o que ele faz quando não está em casa. Eu gostaria de saber com quem conversa e quem conhece na internet.

Cada vez que chega a casa eu me pergunto o que ele fez o dia todo mas ele não me explica nada. Fecha-se em copas.

Às vezes eu mexo nas coisas dele ou entro no computador dele.” Estes são apenas alguns dos comentários repetidos entre pais de adolescentes.

A razão pela qual muitos pais fazem extensos interrogatórios aos seus filhos tem a ver com os medos gerados pelo mundo exterior.

Pode ser resumido no medo de que algo de mau aconteça aos filhos. O mundo, a rua ou a internet estão cheios de perigos.

Ao longo da adolescência, os jovens realizam duas operações que estão intimamente ligadas e que são necessárias.

Por um lado, ao sentir a necessidade de criar o seu próprio espaço eles recolhem-se na sua própria privacidade, livre da tutela dos pais que controlam tudo e, por outro, precisam explorar o mundo para alcançar a exogamia, que lhes permitirá formar uma família, sair de casa, ou assumir as suas próprias responsabilidades e viver em sociedade.

Há uma geração atrás, os adolescentes faziam estas duas operações rompendo com os pais numa mudança radical.

Tinham outros interesses, ouviam outra música, vestiam-se de maneira diferente. Num dado momento, havia uma ruptura, fruto de uma crise, e o jovem afastava-se dos pais e iniciava uma vida mais autónoma. Falava-se em rebeldia da juventude.

Para evitar que o adolescente tenha frustrações os pais acabam por super-proteger os filhos.

Actualmente, apesar da ilusão de que não há diferença entre uma geração e a outra, ela manifesta-se de outras maneiras. É algo estrutural em cada geração, mesmo que tenha novas formas.

Em relação às gerações passadas, agora tudo é mais subtil. Os pais esforçam-se para ouvir a mesma música, vestem-se da mesma forma, são pais “modernos”.

Mas, ao mesmo tempo, assim como com os seus próprios pais, eles tentam impedir os filhos de se separarem e acabam por recorrer à superprotecção.

O argumento usado é o de evitar que o adolescente tenha frustrações. No entanto, os pais fazem isso pelos filhos ou por eles?

Verificamos, ouvindo os adolescentes, que eles têm dificuldade em criar espaços de intimidade porque os pais estão muito em cima deles.

Uma mãe disse-me: “Eu quero que minha filha sinta que eu sou amiga dela”.

Efectivamente há perigos na sociedade e há jovens que fazem coisas delicadas. De qualquer forma, esta época não é pior do que outras em termos de perigos.

No entanto, já não vemos crianças na rua a brincar sozinhas – quando no passado era a coisa mais normal do mundo.

Na era da informação, tudo é amplificado. Algo que acontece no Bornéu pode servir para assustar os pais e pensar que isso certamente pode acontecer com os seus filhos.

Tudo isto esconde outra questão que o psicanalista Jacques Alain Miller define como “a intromissão do adulto na criança”. O que significa isto?

A intrusão tem a ver com querer moldar as crianças à nossa imagem, baseada em ideais, o que é verdadeiramente impossível e está na base do conflito geracional.

Os pais devem permitir que o adolescente possa experimentar e encontrar os seus próprios limites.

O adolescente deixa de ser transparente aos olhos dos seus pais e fecha-se mais sobre si mesmo.

A reacção dos pais é de mais controlo, opinar sobre a sua vida, interferir nos estudos, nas amizades, nos momentos de diversão, pressioná-lo para que saia ou deixe de sair, imiscuir-se sobre o que lhes convém.

A reacção lógica dos adolescentes é geralmente o silêncio ou o negativismo, o que gera um círculo vicioso de impotência e mal-estar.

Provavelmente ajuda recordar que nós adultos fomos adolescentes e que passámos por situações de confusão, momentos difíceis e que há algo inevitável em tudo isso.

Nas associações de pais, geralmente insiste-se em falar sobre como colocar limites nos filhos.

Podemos brincar com isso e pensar se os pais não precisam de se limitar para intervir menos na vida dos filhos.

Pense nos limites como uma separação. Separar-se deles para poder acompanhá-los melhor na jornada que, definitivamente, é deles.

A nossa é a nossa. Aproveitar isto para fazer uma introspecção sobre a nossa vida como adultos.

São muitos os pais que pensam que os filhos têm de viver as suas próprias experiências, cometer erros, serem mais autónomos.

Como se diz em francês: “faire confiance”, que nada mais é do que permitir que o adolescente possa experimentar e encontrar os seus próprios limites.

Traduzido/adaptado por Pedro Martins a partir de “Por qué los padres también deberían ponerse límites en la relación con sus hijos” – Mario Izcovich

puberdade psicologia clínica

A Puberdade e as suas consequências

A palavra puberdade, de origem latina, aparece no dicionário etimológico como o “conjunto de transformações psicofisiológicas ligadas à maturação sexual que traduzem a passagem progressiva da infância à adolescência”.

Trata-se de um conjunto de processos geneticamente pré-definidos que desencadeiam e levam à maturação sexual.

É uma fase crucial de mudanças somáticas e psicológicas, durante a qual se operam reestruturações nucleares que vão constituir matrizes da personalidade a consolidar ao longo da adolescência.

A puberdade caracteriza-se pelo surgimento da capacidade orgástica e reprodutiva. Sendo que a relação entre a preeminência do desejo sexual e a efectivação dessa possibilidade constitui uma fonte de angústia.

A puberdade tem o importante papel de transição, ou seja, põe fim à latência e dá início à adolescência e prepara o jovem para a autonomia. Trata-se de um processo ancorado no biológico mas com repercussões psicológicas, ou seja, organizador da vida psíquica, nomeadamente da psicossexualidade.

 

A crise na puberdade como organizador

Ao contrário do que acontece na adolescência, na puberdade pode mesmo falar-se de uma crise. Trata-se de um processo curto mas de grande agitação e até de disrupção, determinado por factores genéticos, que em último caso pode ser considerado um factor de risco para a saúde mental.

Uma vez que a crise puberal é uma situação disruptiva com implicações no narcisismo infantil, se esta crise se dá num Eu muito fragilizado pode acontecer que o desenvolvimento se interrompa, caindo numa situação psicopatológica.

 

Na puberdade dão-se alterações muito bruscas

A maturação genital que ocorre na puberdade impõe uma série de transformações corporais e funcionais de uma maneira tão brusca que provocam sentimentos de estranheza e até, em alguns adolescentes, despersonalização. É, talvez, a idade de maior sofrimento psíquico, caracterizado por estados confusionais de todo o tipo.

A puberdade no sexo feminino não apresenta a mesma continuidade com a latência como acontece no sexo masculino. Nesta altura a púbere sente que tem um corpo estranho, diferente daquele corpo harmónico da latência. Esse era um corpo controlável, este está “descontrolado” e a rapariga sente-se insegura e ineficiente sem controlo sobre o seu corpo, sendo incapaz de mentalmente elaborar as transformações que se processam.

Com a puberdade abre-se um caminho tumultuoso mas necessário para a evolução psíquica. Há uma luta entre o proibido e o imperioso.

No entanto este processo de bruscas alterações será sentido de forma menos dramática se decorrer dentro da evolução normal onde o desejo de crescer é predominante. Nessa altura começará a apreciar as alterações no seu corpo – face, seios, estatura, postura -.

 

O corpo na puberdade

O corpo com o qual a púbere se depara é um corpo estranho, diferente daquele que ela conhecia na latência. Esse era estável, sem grandes oscilações. Agora o corpo muda todos os dias. Esta velocidade dificulta a elaboração mental das transformações em curso.O corpo que a rapariga conhece é aquele da latência, e o corpo que lhe surge é um corpo de desejo, que é considerado estranho. Este “novo corpo” vai obrigar ao luto do corpo infantil.

A representação e a forma como é integrado o corpo sexuado, constituirá a matriz sobre a qual se vai organizar a futura sexualidade.

A forma como o corpo é investido narcisicamente, como masculino ou feminino, depende da forma de relacionamento objectal que a púbere teve com os pais e em particular da narcisação que deles recebeu. A púbere vai amar ou odiar o seu corpo conforme se sentiu amada ou rejeitada pelos pais.

A negação do corpo sexuado, fantasia de não pertencer a nenhum género (roupas muito largas), podem surgir nesta altura.

A integração da imagem do corpo sexuado no Self sofre vicissitudes e angústias que constituem pontos cruciais do desenvolvimento e da superação da puberdade”

As transformações nas relações entre pais e filho púbere estão ligadas às mudanças ocorridas na sua aparência física.

À medida que o corpo cresce também cresce o desejo de escapar ao domínio do outro, o que leva a pôr em causa as regras.

 

A regressão na puberdade

Na puberdade há um desejo de reconstruir a relação fusional como forma de atenuar a angústia de separação que reaparece no primeiro momento da maturação sexual genital.

Esta forte tendência regressiva até à mãe faz com que a ambivalência domine a situação: por um lado a dependência da mãe reaparece, negando a separação e o crescimento, e por outro, é agressiva, desafia a autoridade e as normas.

O desenvolvimento, de uma maneira geral, faz-se no permanente jogo entre forças de progressão e as paragens transitórias sempre ameaçadas pela regressão, no caminho para a diferenciação e a identidade. Desenvolver-se é diferenciar-se, e diferenciar-se é afirmar-se. Cada passo da diferenciação psíquica implica uma certa desorganização, acompanhada de um movimento regressivo.

Esta regressão não deve ser vista como uma coisa negativa uma vez que esta se encontra ao serviço do desenvolvimento, preservando o narcisismo, e corresponde a um tempo de espera que compense o descompasso entre a maturação sexual e a maturidade psicológica. O êxito na evolução para a feminilidade passa pela capacidade de superar as tendências regressivas da puberdade.

 

 A genitalidade e a sexualidade na puberdade

O termo puberdade tem uma relação estreita com a sexualidade. A palavra deriva de pūbēs, que designa a região genital. Também associado ao termo puberdade está, “velar” e “esconder”, neste caso escondido pelos pêlos. A descoberta da sexualidade é uma das tarefas dominantes da puberdade.

A puberdade com as suas transformações impõe a realidade (para alguns dolorosa) de um corpo sexuado e obriga a assunção de pertença a um dos géneros.A pulsão tem agora um objecto sexual – o outro -.

Com a maturação genital passamos do “não posso” da infância para o “posso” do púbere.

Nesta fase o funcionamento mental do púbere caracteriza-se por uma tensão excessiva, uma energia livre e uma sexualidade genital. Esta muitas vezes fica dentro do corpo (somatizações), ou é descarregada através do agir.

Em virtude do que foi descrito anteriormente pode compreender-se que os mecanismos de defesa mais usuais na puberdade sejam o ascetismo e a intelectualização. No que diz respeito à intelectualização, esta tem como fim a repressão emocional através da racionalização.

 

 

Excertos da Tese de Mestrado: “CONTRIBUTO À COMPREENSÃO DA ANOREXIA MENTAL FEMININA A PARTIR DO PROCESSO DE SEPARAÇÃO-INDIVIDUAÇÃO” – Pedro Martins

dores do crescimento psicólogoclínico

As dores do Crescimento

As dores do crescimento

Luke, vinte e quatro anos, faz duas sessões por semana há seis anos. Ele dedicou-se, com o apoio financeiro dos pais, a “trabalhar em si mesmo”. Nunca chega atrasado; nunca se esquece da sessão, apesar das várias alterações de horário devido ao meu trabalho e à escola dele.

Ao longo dos últimos seis anos ele “odiou-me”, “amou-me” e sentiu que eu era “irritante e muito maternal” com ele.

Sentimentos positivos, sentimentos negativos, sentimentos neutros não parecem mudar o seu compromisso com o nosso processo. Ele quase desistiu do ensino secundário, já que mal conseguia sair da cama para ir à escola, mas agora está a estudar medicina, em breve vai ajudar outros que precisam dele. Os pais disseram-me que temiam que, com tanta psicoterapia, ele quisesse ser psiquiatra, como se isso fosse uma má escolha. Para sorte deles, ele está a caminho de ser cirurgião.

Como ele diz: “Tenho pouco interesse em falar com as pessoas. Eu odiaria ter que lidar com pessoas como eu que berram e gritam consigo, como se fosse a mãe deles.” Eu quase senti que era um pedido de desculpa por tempos muito difíceis que passámos juntos, mas ele não tem razão para remorsos. Nós concordámos em trabalhar juntos e empenhados numa luta honesta, e a frustração e a raiva, são inevitáveis. Ambos tivemos comportamentos que nos fazem desejar que tivéssemos sido mais ponderados e controlados.

“Porque é que eu quero ver você todos os dias”, Luke pergunta-me de uma maneira doce, cativante e desafiadora. “Você está a avançar e com isso surgem as dores do crescimento”, digo-lhe, explicando que ele agora está no meio de um grande crescimento emocional, e a tentar decidir entre tantos encontros com raparigas, com quem ele deseja ter um relacionamento mais sério a longo prazo. Com um enorme sorriso, ele diz: “Bolas! Obrigado Dra. Vollmer, fico tão feliz de ouvir isso.”

De repente, eu enquadrei a dor de Luke como um meio para um fim mais profundo, e de repente ele deixou de se sentir mal com a sua indecisão, para se sentir bem quanto à forma como estava a considerar as coisas. Luke teve muitos problemas com os relacionamentos. Não tanto por as raparigas não gostarem dele, mas por não aprofundar os seus sentimentos em relação a elas. Consequentemente, cresceu insatisfeito com a maioria das suas experiências íntimas.

Ao explorarmos os seus próprios desejos num relacionamento, ele tornou-se mais cauteloso ao entrar em assuntos amorosos quando se tratava de gostar mais profundamente de uma rapariga.

Agora, Luke tem que tolerar a solidão da qual se defendeu através de constantes relacionamentos insatisfatórios.

A sua vontade de me ver diariamente é reflexo do seu novo desafio e da gestão desses sentimentos difíceis. Ao termos compreendido a necessidade de Luke me querer ver com mais frequência, e de a pensarmos à luz do seu crescimento emocional, não foi necessário aumentar o número de sessões.

 

 

Traduzido/adaptado por Pedro Martins

A partir de “Why do I want to see you everyday” – Shirah Vollmer

Um entristecido adeus à infância. Pedro Martins Psicoterapeuta - Psicoterapia

Um Entristecido Adeus à Infância

Crescer é abdicar dos sonhos de infância e aceitar o nosso passado com todas as imperfeições que possa ter tido. É viver entre um entristecido adeus à infância – ou seja, a si mesmo e aos objectos do passado – e à superação gradual, ansiosa e esperançada, de muitas barreiras até à entrada no desconhecido mundo da vida adulta.

 

Na adolescência dá-se um corte com as ligações da infância e com a dependência dos pais.

 

O jovem estabelece novos vínculos e adquire capacidade para novas experiências afectivas e sexuais. Desidealiza as figuras parentais e procura novos modelos exteriores.

Na adolescência – onde se vivenciam estados afectivos de luto e paixão – dá-se um corte com as ligações da infância e com a dependência dos pais.

Para além da mudança de objecto de amor, há também mudança de objectivos.

Os interesses deixam de ser quase exclusivamente narcísicos (característicos da infância) para passarem a ser sociais.

O desejo de parar o tempo, a mudança, pode ser considerada uma excepção, que se deve, essencialmente, a uma incapacidade de enfrentar o novo.

No desenvolvimento normal, em contraposição à tendência de manutenção do estado original de fusão, há um impulso à diferenciação e individuação que visa a aquisição e estabelecimento da identidade.

Impossibilitado da fazer a “passagem”, o jovem em desenvolvimento fica amarrado às coisas conhecidas e controláveis (próprias do universo infantil) que produzem um sentimento de segurança.

 

No desenvolvimento normal prevalece a expectativa de uma independência com realizações pessoais e prazeres por satisfazer.

 

Aqueles que não podem desfrutar das coisas transitórias da vida (como acontece na evolução), perder umas para se ganhar outras, são os que na sua história pessoal sentiram as mudanças de forma catastrófica, ao ponto de predominarem os sentimentos de angústia e vivências de perda.

Perante o choque entre forças progressivas e regressivas prevalece a expectativa de uma independência com realizações pessoais e prazeres por satisfazer ao abrigo de uma genitalidade crescente e desejante como impulso para a independência e liberdade.

O desejo que a criança tem de ocupar o lugar do adulto (o lugar entre os adultos) pode finalmente ser realizado, elaborando os sentimentos de perda e deixando-se capturar e fascinar pelos encantos do novo.

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